sexta-feira, 26 de setembro de 2014

UM CÃO CHAMADO DEPRESSÃO

Olá pessoal. Há quanto tempo, hein?!

Apesar do tempo, o assunto-chave desse blog nunca desaparece totalmente de minha vista. Como já escrevi num post "antigo" acredito que os sintomas dessa síndrome possam ser controlados mas, uma vez picado pela depressão, o veneno parece que nunca mais sairá por completo.

Dia desses tropecei no vídeo abaixo e achei muito bom. Espero que curtam:


segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

CONFORTABLY NUMB

Ontem à noite, dando uma zapeada pouco antes de ir dormir vi que estava passando um show do Pink Floyd no Multishow.

Engraçado: eu gosto muito mais desses caras agora que estou mais velho do que quando era garoto. Talvez seja porque algumas de suas canções passaram a fazer sentido para mim.

Ouvindo "Time" não pude deixar de notar extrema semelhança entre a letra da música e coisas que passam por minha cabeça de vez em quando:

"...E então um dia você descobre que dez anos ficaram para trás
Ninguém lhe disse quando correr, você perdeu o tiro de partida.

E você corre, corre atrás do Sol, mas ele está se pondo,
Fazendo a volta para nascer outra vez atrás de você.
O Sol é relativamente o mesmo, mas você está velho,
Com menos fôlego e um dia mais próximo da morte.

Cada ano vai ficando mais curto, parece não haver tempo para nada.
Planos que dão em nada, ou meia página de linhas rabiscadas.
Esperar em quieto desespero é o jeito inglês.
O tempo se foi, a música terminou, pensei que eu tivesse algo mais a dizer..."

De fato, na prática, minha vida não mudou nada desde que entrei em depressão a não ser pelo fato de não mais me sentir tão mal como nos piores momentos da crise. 

Mas minha vida profissional não andou nem um centímetro... Continuo tentando algumas coisas, mas não saio do lugar. 

E, de certo modo, pior ainda: não acho que deva me debater para tentar qualquer outra coisa. Me parece inútil.

Será que ainda estou/sou deprimido ou é apenas a idade, a realidade e a lembrança dos últimos vários anos "perdidos" (in a relative way..)?

Será que essa minha relativamente feliz inércia é, como em "Confortably Numb",

"...essa sensação mais uma vez,
não consigo explicar, você não entenderia.
Não é assim que eu sou,
Me tornei confortavelmente entorpecido...".






segunda-feira, 11 de junho de 2012

O PODER DOS QUIETOS

Finalmente, depois de passar uma vida inteira ouvindo “você tem de ser mais desinibido...”, “você tem de ser mais sociável...”, “você é muito fechado...”, “você é muito calado...”...


“...hoje abrimos espaço para um número notavelmente limitado de estilos de personalidade. Dizem que para sermos bem-sucedidos temos que ser ousados, que para sermos felizes temos que ser sociáveis.

Vemo-nos como uma nação de extrovertidos --o que significa que perdemos de vista quem realmente somos. Dependendo de que estudo você consultar, de um terço a metade dos norte-americanos é introvertido-- em outras palavras, uma em cada duas ou três pessoas que você conhece. (Considerando que os EUA estão entre as nações mais extrovertidas, o número deve ser pelo menos tão alto quanto em outras partes do mundo.) Se você não for um introvertido, certamente está criando, gerenciando, namorando ou casado com um.

Se essas estatísticas o surpreendem, provavelmente é porque muitas pessoas fingem ser extrovertidas. Introvertidos disfarçados passam batido em parquinhos, vestiários de escolas e corredores de empresas. Alguns enganam até a si mesmos, até que algum fato da vida --uma dispensa, a saída dos filhos de casa, uma herança que permite que passem o tempo como quiserem-- os leva a avaliar sua própria natureza.

Você só precisa abordar o tema deste livro com seus amigos e conhecidos para descobrir que mesmo as pessoas mais improváveis consideram-se introvertidas.

Faz sentido que tantos introvertidos escondam-se até de si mesmos. Vivemos em um sistema de valores que chamo de "ideal da extroversão" --a crença onipresente de que o ser ideal é gregário, alfa, sente-se confortável sob a luz dos holofotes. O típico extrovertido prefere a ação à contemplação, a tomada de riscos à cautela, a certeza à dúvida. Ele prefere as decisões rápidas, mesmo correndo o risco de estar errado. Ele trabalha bem em equipes e socializa em grupos.

Gostamos de acreditar que prezamos a individualidade, mas muitas vezes admiramos um determinado tipo de indivíduo --o que fica confortável sendo o centro das atenções. É claro que permitimos que solitários com talento para a tecnologia que criam empresas em garagens tenham a personalidade que quiserem, mas estes são exceções, não a regra, e nossa tolerância estende-se principalmente àqueles que ficaram incrivelmente ricos ou que prometem fazê-lo.

DECEPÇÃO

Introversão --com suas companheiras sensibilidade, seriedade e timidez-- é, hoje, um traço de personalidade de segunda classe, classificada em algum lugar entre uma decepção e uma patologia. Introvertidos vivendo sob o ideal da extroversão são como mulheres vivendo em um mundo de homens, desprezadas por um traço que define o que são. A extroversão é um estilo de personalidade extremamente atraente, mas a transformamos em um padrão opressivo que a maioria de nós acha que deve seguir.

O ideal da extroversão tem sido bem documentado em vários estudos, apesar dessa pesquisa nunca ter sido agrupada sob um único nome. Pessoas loquazes, por exemplo, são avaliadas como mais espertas, mais bonitas, mais interessantes e mais desejáveis como amigas. A velocidade do discurso conta tanto quanto o volume: colocamos aqueles que falam rápido como mais competentes e simpáticas que aqueles que falam devagar.

A mesma dinâmica aplica-se a grupos, em que pesquisas mostram que os eloquentes são considerados mais inteligentes que os reticentes --apesar de não haver nenhuma correlação entre o dom do falatório e boas ideias

Até a palavra "introvertido" ficou estigmatizada --um estudo informal feito pela psicóloga Laurie Helgoe mostrou que os introvertidos descrevem a própria aparência física com uma linguagem vívida ("olhos verde-azulados", "exótico", "maçãs do rosto salientes"), mas quando se pede para descreverem introvertidos em geral eles delineiam uma imagem insossa e desagradável ("desajeitado", "cores neutras", "problemas de pele").
Mas cometemos um erro grave ao abraçar o ideal da extroversão tão inconsequentemente. Algumas das nossas maiores ideias, a arte, as invenções --desde a teoria da evolução até os girassóis de Van Gogh e os computadores pessoais-- vieram de pessoas quietas e cerebrais que sabiam como se comunicar com seu mundo interior e os tesouros que lá seriam encontrados.

Sem introvertidos, o mundo não teria a teoria da gravidade; a teoria da relatividade; "O Segundo Advento", de W.B. Yeats; Os "Noturnos" de Chopin; "Em Busca do Tempo Perdido", de Proust; Peter Pan; "1984" e "A Revolução dos Bichos, de George Orwell; "O Gato do Chapéu", do Dr. Seuss; Charlie Brown; "A Lista de Schindler", "E.T." e "Contatos Imediatos de Terceiro Grau", de Steven Spielberg; o Google; Harry Potter.

ESTÍMULOS
Como escreveu o jornalista científico Winifred Gallagher: "A glória da disposição que faz com que se pare para considerar estímulos em vez de render-se a eles é sua longa associação com conquistas intelectuais e artísticas. Nem o E=mc² de Einstein nem 'Paraíso Perdido', de John Milton, foram produzidos por festeiros."

Mesmo em ocupações menos óbvias para os introvertidos, como finanças, política e ativismo, alguns dos grandes saltos foram dados por eles. Figuras como Eleanor Roosevelt, Al Gore, Warren Buffett, Gandhi --e Rosa Parks-- conquistaram o que conquistaram não "apesar de", mas por causa de sua introversão.

Mesmo assim, muitas das mais importantes instituições da vida contemporânea são criadas para aqueles que gostam de projetos em grupo e altos níveis de estímulo. Nas turmas infantis, cada vez mais as mesas das salas de aula são arrumadas em forma de concha, a melhor para encorajar o aprendizado em grupo, e pesquisas sugerem que a grande maioria dos professores acha que o aluno ideal é um extrovertido.

As crianças assistem a programas de TV em que os protagonistas não são crianças como qualquer uma, mas estrelas do rock, por exemplo, como Hannah Montana.

Quando adultos, muitos de nós trabalhamos para empresas que insistem em que trabalhemos em grupo, em escritórios sem paredes, para supervisores que valorizam "um bom relacionamento interpessoal" acima de tudo. Para avançarmos em nossas carreiras, espera-se que nos promovamos descaradamente.

Os cientistas cujas pesquisas conseguem financiamento muitas vezes possuem personalidades confiantes, talvez até demais. Os artistas cujos trabalhos adornam as paredes de museus de arte contemporânea posam de forma a impressionar nos vernissages. Os autores que têm seus livros publicados --tidos no passado como uma raça reclusa-- hoje são avaliados pelos editores para assegurar que possam participar de programas de entrevistas. (Você não estaria lendo este livro se eu não tivesse convencido meu editor de que sou suficientemente pseudoextrovertida para promovê-lo.)

DOR

Se você é um introvertido, também sabe que o preconceito contra os quietos pode provocar uma profunda dor psicológica. Quando criança, pode ter ouvido seus pais se desculparem pela sua timidez. ("Por que você não pode ser mais parecido com os meninos Kennedy?", repetiam constantemente os pais de um homem que entrevistei.) Ou na escola você pode ter sido estimulado a "sair da sua concha" --expressão nociva que não valoriza o fato de que alguns animais naturalmente carregam seu abrigo aonde quer que vão, assim como alguns humanos.

"Ainda ouço todos os comentários da minha infância em minha cabeça, dizendo que eu era preguiçoso, burro, lento, chato", escreveu um membro de uma lista de e-mail chamada Refúgio dos Introvertidos. "Quando eu tive idade suficiente para entender que eu simplesmente era introvertido, a suposição de que algo estava inerentemente errado comigo já era parte do meu ser. Queria encontrar esse vestígio de dúvida e tirá-lo de mim."

Agora que você é um adulto, talvez ainda sinta uma ponta de culpa quando recusa um convite para jantar para ler um bom livro. Ou talvez você goste de comer sozinho em restaurantes, podendo passar sem os olhares de pena dos outros clientes. Ou lhe dizem que você "fica muito na sua cabeça", uma frase muitas vezes utilizada contra os quietos e cerebrais.

É claro que há outro nome para pessoas assim: pensadores.
O livro "O Poder dos Quietos", lançado em maio pela editora Agir, já está à venda.

sábado, 3 de março de 2012

A PIOR E A MELHOR

A depressão foi, de que me lembre, a pior coisa que me aconteceu. Durante alguns anos foi minando minhas forças, foi desintegrando a pessoa que eu era e quase acabou comigo...

A depressão foi, entre tantas coisas, uma das melhores que aconteceu comigo. Foi um doloroso processo de recolhimento, imersão em mim mesmo, profundamente revelador e pacificamente libertador...

Das máscaras para o ininterrupto teatro dessa vida, não preciso mais. Agora sou apenas eu mesmo.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Olá pessoal.

Algumas pessoas me escreveram dizendo que sentem saudades de meus posts. É muito bom receber mensagens assim.

Estou distante do Crônicas há algum tempo e ando me torturando com a ideia de que abandonei os leitores. Queria bolar algo bom pra escrever a vocês mas, dada a urgência em minha consciência, vai assim mesmo.

Será, ao menos, uma satisfação.

Sendo até demasiadamente curto e grosso, aí vai: não tenho postado mais nada aqui porque eu não me sinto mais deprimido. Simples assim.

Quando escrevia, sem muita elaboração de ideias, de estilo ou de gramática, eu estava sendo sincero, como que purgando algo de dentro de mim.

Agora, confesso, tenho até certo receio de começar a escarafunchar os pensamentos, que estão voltados para outras questões, minha mente em outra sintonia.

Não sei bem o que aconteceu. Eu já havia parado com a medicação e terapia há tempos mas continuava a lutar contra um sentimento de angústia constante, de inadequação, de inferioridade e tantos outros que a maioria aqui conhece bem.

Mas, não sei bem como - prometo refletir melhor sobre isso - os ventos mudaram a posição de minhas antenas. Na vida real, prática, nada mudou: continuo sem conseguir emprego de jeito nenhum e pegando um ou outro trabalho pequeno (no sentido financeiro) pra fazer mas, de algum modo, não me sinto mais tão mal como antes.

Então, para não postar algum artigo pra lá de fake, parei de escrever aqui. Salvo o post anterior sobre a Páscoa, tenho me dedicado a outras atividades no intuito de aprimorar minhas aptidões e poder oferecer serviços melhores a quem concordar em ser meu cliente em marketing, publicidade e comunicação.

Não sei se isso é uma fase. Não me sinto "maníaco". Na verdade, ando bem calmo e tranquilo.

Não gosto de dar conselhos e mensagens de positivismo, mas se eu saí do poço de areia movediça psico-emocional em que estava, então qualquer um também sai. É questão de tempo, sorte, ou de vento nas antenas, não sei.

Vou manter o blog no ar, claro, pois sempre há a possibilidade de surgir algum pensamento que valha a pena dividir. Por hora, agradeço a todos que me escreveram e que continuam seguidores.

Um abraço e até breve.
Ou não.

sábado, 23 de abril de 2011

A Origem da Páscoa – versão Science Fiction


Em um lugar remoto do Universo, Pahz Khoa, um ser poderosíssimo, observava.

Com um tamanho 200 vezes maior que o Sol, sua razão de existir era manter os planetas livres de doenças, de vermes parasitas que pudessem colocar em risco seus equilíbrios naturais, seus ecossistemas.

Por zilhões de anos Pahz Khoa manteve a ordem e limpeza nos planetas de vários sistemas solares. Bastava ver que um planetinha começava a ficar infestado de vermes, pimba!, lançava seus raios cósmicos-megaplasmáticos, eliminava toda a infecção do planeta e tudo voltava ao normal.

Certa vez, meio sem querer, Pahz Khoa notou que num planetinha azulado comaçava a proliferar uma peste bípede. Eram serezinhos bem desprezíveis, não traziam nada de bom ao planeta mas se achavam os reis da cocada preta, se sentiam o centro do Universo, como se este tivesse sido criado para eles.

Pahz Khoa abriu sua planilha de projeção de evolução de espécies em seu iPaedh e se assustou quando viu que, em pouco mais de 2.000 anos – um piscar de olhos para ele – aquela especiezinha nojenta iria colocar o planetinha azul em sério risco.

Ele já preparava sua pontaria quando em seu smarthphoneae um alarme soou. Era um aviso sobre uma das regras do manual de limpeza e conservação do Universo: antes de eliminar uma espécie, ele precisava verificar, observar de perto se realmente deveria acabar com ela.

Mas havia dificuldades nesse caso. O planeta era muito pequeno, os seres da peste bípede que o infestava eram minúsculos, difíceis de enxergar. Pahz Khoa já tinha alguns trilhões de anos e sua vista andava meio cansada...

Então ele teve uma ideia: utilizando-se de seus incomensuráveis poderes e controle absoluto sobre suas formas e células, como que num processo de mitose fez com que um minimicrominúsculo pedaço de si mesmo cruzasse o espaço sideral e se depositasse dentro de uma fêmea da praga, emprenhando-a. Assim ele se transformaria num daqueles seres e poderia observá-los bem de perto.

O microscópico pedaço de Pahz Khoa nasceu como um ser daquela espécie prestes a ser dizimada, viveu entre eles e andou aprontando algumas interferências não permitidas, como fazer cegos enxergarem, levantar mortos das tumbas e transformar água em vinho numa festa repleta de menores de idade.

Ao ficar sabendo disso, seu chefe no departamento de limpeza universal ficou furioso. Mas antes que pudesse ser julgado e punido pelas interferências não autorizadas, Pahz Khoa fugiu, sumiu no espaço sideral.

O chefe, não conseguindo encontrá-lo em nenhum canto do Universo, pensou numa maneira macabra de fazê-lo aparecer: iria manipular os seres da praga naquele planetinha azul de modo que prendessem e torturassem da maneira mais cruel, sádica e sanguinária aquele ser que era na verdade um pedacinho de Pahz Khoa.

Como num vudu cósmico, imaginava que espetando, esfolando, chicoteando, esfacelando, esgarçando a pele daquele serzinho Pahz Khoa também sentiria o mesmo tormento e, não aguentando, retornaria para ser julgado.

Não adiantou nada. Pahz Khoa continuou desaparecido nos confins do Universo, nunca mais voltou. O chefe dele, por essa interferência também indevida, foi punido e teve de deixar o cargo.

E lá, no planetinha azul, a praga continuou sua marcha rumo à devastação.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

CONFESSO QUE ESTOU CONFUSO

(Obs.: esse post não tem nada a ver com depressão, eu acho...).

Pensar nas pessoas que conheço, alguns amigos, alguns conhecidos, alguns parentes próximos, outros distantes me deixa confuso.

São pessoas de bem.

Não cairia no clichê de dizer que são cidadãos exemplares, até porque nunca vi suas declarações de IR, mas são gente comum, que trabalha duro para garantir a sobrevivência e algum conforto para suas famílias.

Alguns são mais seriamente religiosos, outros menos, porém espiritualizados. Aparentemente levam suas vidas dentro dos padrões social e moralmente aceitos como corretos em nosso tempo.

São, também, pessoas inteligentes, bem instruídas, cultas em relação à grande maioria, com boa ou ótima formação, bem informadas e com acesso aos mais variados jornais, revistas, livros, rádio, cinema, teatro, TV e internet.

Todos, sem exceção, acreditam no bem, em Deus, no valor absoluto da vida, tem seus padrões de certo e errado definidos em parte pela religião, em parte pela cultura, hábitos e costumes que passam de geração a geração, com pequenas evoluções caso contrário ainda estaríamos cuspindo catarro nas escarradeiras que antes decoravam as salas de visitas da burguesia paulistana (sério, escarrar durante uma visita era chique!) e escravizando afrodescendentes.

Somando tudo isso – e mais alguns fatores que não me lembro de citar no momento – meu cérebro se retorce em angustiantes exercícios mentais para tentar entender o motivo de fecharem os olhos para o que considero uma importante questão moral e ética: o vegetarianismo.

Como podem essas pessoas fingirem que não sabem o que se passa nas fazendas de criação e nos matadouros e ainda seguirem em frente cravando os dentes num bife que outrora era um ser vivo?

Como pode uma pessoa que se afirma religiosa e critica o aborto, pois para ela a vida é um valor absoluto, não se importar com a vida que se extinguiu para que ela pudesse saciar o pecado da gula com o que ela chama de “deliciosa picanha”?

Dizer que “a Bíblia (ou sua religião) permite” é uma afronta à inteligência de qualquer um que já tenha lido ao menos um pedacinho deste livro, pois a Bíblia também permite escravizar pessoas, matar a pedradas, etc., etc.

Dizer que “é costume” também chega a ser idiota discutir, pois os costumes, como citei num parágrafo anterior, evoluem.

Se só Deus pode dar e tirar a vida, porque essa regra só serve para algumas vidas e não todas?

Será que, para elas, animais são “coisa” e não “indivíduos”?

Será que é assim que deve ser, termos uma moral e ética seletiva, optativa, ou seja, adotar como correto somente aquilo que nos interessa e descartar como bobagem aquilo que nos incomoda?

Será que eu estou errado? Será que é bobagem considerar animais como seres que também tem direito à própria vida e liberdade?
Talvez eu seja apenas um cara problemático, confuso, meio perturbado ou então a soma disso tudo e mais algumas.

É sério! Entre tantas outras coisas, essa é mais uma que eu gostaria de entender: porque as pessoas fecham os olhos para isso.



 

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

ATUALIZANDO...

"O que é necessário para mudar uma pessoa é mudar sua consciência
de si mesma."
(Abraham H. Maslow)








Olá.

Estou um pouco afastado do blog, como você já deve ter percebido, mas os motivos agora são outros. Além de estar envolvido em dois novos projetos, há especialmente uma questão que me fez parar um pouco com meus textos aqui: estou farto de ser deprimido.

É isso, cansei. Quero "mudar de personagem".

Acredito (apesar de sempre afirmar que esse verbo deixou de fazer parte de meu vocabulário) que nunca poderei deixar de ser eu mesmo e que a depressão deixará, assim como alguns tipos de ferimentos, cicatrizes que talvez jamais desapareçam, mas posso tentar, todo dia pela manhã, escolher como ele será. E uma maneira de meus dias serem menos depressivos é tentar não pensar nisso, focar em outra coisa.

Voltando ao dilema de Tostines, não sei se isso é a depressão diminuindo e eu recompondo minhas forças ou se encontrei forças para enfrentar a depressão. De qualquer modo, decidi ir em frente, talvez hipnotizado pelo clima de início de ano.

Antes de cair em depressão, ir à academia era para mim algo como escovar os dentes ou tomar banho, ou seja, algo corriqueiro, inserido em meu dia-a-dia e que deveria fazer todos os dias quase que automaticamente. Em certa época, costumo dizer que "ficava sem ar, mas não sem academia". Frequentei academias por mais de 25 anos quase que diariamente, mas parei no início de 2007 com uma série de desculpas: minhas costas doíam, estava sem grana, não podia ficar "vagabundando" na academia enquanto não arrumasse emprego... ...

Nada disso mudou, mas agora resolvi, de uma vez por todas, voltar a treinar. Meu pensamento atual é: já que a merda da minha vida não muda mesmo, que ela seja menos fedorenta.

Mas uma vez ligado a um assunto, parece que ele te persegue. A atenção seletiva fez seu trabalho e notei que num intervalo de semana e meia a depressão foi alvo de duas matérias jornalísticas. Uma foi hoje, na Folha de São Paulo, dizendo que geneticistas parecem ter encontrado um gene que poderia predispor pessoas à depressão. Outra, também na Folha, divulga um novo antidepressivo que alteraria menos a libido.
 
Pelo jeito, ainda vamos ler muito sobre depressão. Acho que isso é bom, mas gostaria de conseguir prestar menos atenção a isso.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

FELIZ NATAL

Mesmo que você não participe de sessões espíritas nem seja Pai de Santo, não se avexe, o espírito de Natal vai baixar em você.

Isso significa que, nesta época mágica do ano, você vai falar de amor ao próximo, de confraternização, desejar saúde e felicidades a torto e a direitoe terá mirabolantes ilusões esquizofrênicas sobre como será o ano seguinte.

Você vai permitir que as crianças se sentem no colo de um obeso idoso fantasiado de vermelho sem que isso se transforme em acusação de assédio nem processo judicial.

Num calor dos infernos nessa época aqui nos trópicos, você desejará que refresque um pouco usando sabão, papel picado, algodão ou bolinhas de isopor para simular o frio e a neve que nunca viu pessoalmente.

À noite de Natal você chamará “de alegria infinita”, apesar de ter passado por um estresse enorme na fila da rotisserie pra pegar o prato congelado e levar logo pra casa e colocar no forno, de ter enfrentado o trânsito ainda mais caótico e quase ter saído no tapa com aquele que enfiou o carro na vaga que você estava esperando.

Nesta noite de paz e de luz, seu sogro vai dormir e babar no sofá e a mãe de seu marido vai torrar o finalzinho de sua paciência querendo lhe explicar como manusear direito o peru (o do forno, não o do filho dela) e vocês não vão brigar “pois é Natal...”.

Você vai aturar as crianças destruindo sua sala enquanto o bendito relógio não bate meia-noite, que as tias exigem que se espere antes de abrir os presentes.

Aliás, por falar em presentes, você vai ganhar algo de que não precisa ou não gosta, esteja avisado de antemão. Treine sua cara de quem adorou o presente durante a tarde, diante do espelho no banheiro, depois que seu tio já bêbado resolver sair dele.

Ah, e avise a todos de que não é preciso regar a árvore de natal, principalmente se tiver as luzinhas pisca-pisca. Da última vez, o choque que a minha avó levou quase fez parar o marca-passo dela.

Bom, então, Feliz Natal.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

FINAL DE ANO...

Olá pessoal.

Não sei como foi nem como termina o ano pra vocês, mas pra mim... Bem, praticamente nada de diferente nem perspectivas.

A única novidade foi ter sido convidado a ilustrar tirinhas sobre um tema muito conhecido nosso para o "Ansiedade/Depressão". Não sei no que isso vai dar (pela minha experiência, posso dizer que sei que não vai dar em nada), mas ao menos me mantém ativo, com a cabeça ocupada e assim não fico louco de vez.

Visitem, deixem comentários, enviem sugestões para novas tiras.

Além de comer e dormir, é só isso que vou fazer até o ano que vem.

Abs e - se é que isso é possível - bom final de ano.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

ALEATORIEDADES

Hoje é 23 de novembro. Na área de trabalho do monitor, o gadget na barra lateral indica 23 graus. O dia esteve cinza e meio abafado. Ainda é cedo mas está escuro e parece que vai chover de novo, como ontem. Preciso antes levar meus cães à rua para aliviar a pressão por satisfazer suas necessidades fisiológicas.

Que coisa: quando não estou catando bosta delas na rua, estou em casa limpando a caixa de areia das gatas. Sou um cata-bosta profissional.

Pronto, voltei.

Recebo um e-mail dizendo que hoje é o Dia Internacional do Livro. Eu e todo o Brasil podemos comemorar: brasileiros de todas as partes comemorem por sermos uma gigantesca nação de analfabetos funcionais. E eu porque há meses publiquei meu livro infantil e vendi a excepcional quantia de um. Sim, um único exemplar.

Então decidi que não quero mais vendê-lo. Vou dá-lo a quem se dispuser ao tremendo esforço de baixar o PDF: http://www.iosbooks.com.br/

Navegando na web, uma frase me chama a atenção: “Uma oportunidade para uma nova vida... Quer romper com o seu passado, começar uma vida nova?“.

Era tudo o que eu queria. Deixar tudo pra tras, começar de novo. Mas a tal frase me leva ao site da Legião Estrangeira e, infelizmente, vejo que não tenho as qualificações necessárias, nem dinheiro pra ir à França me alistar.

Acho que estou, como no título daquele filme, numa fase “pagando bem, que mal tem?“. Não, também não tenho “qualificações” para estrelar um pornô, mas estou apelando a quase qualquer coisa, desde que o salário compense.

E tem de ser rápido, pois as folhas das apostilas do meu MBA já estão acabando.

Usei todas para catar bosta de cachorro nas ruas.




















quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Novo artigo

Ali ao lado, no menu à direita de sua tela, um novo bom artigo: DEPRESSÃO NUMA CONTEXTUALIZAÇÃO CONTEMPORÂNEA.
Aprecie com moderação.

DEPRESSÃO É COMO CHIFRE...

"The real voyage of discovery consists not in seeking new landscapes but in having new eyes."



-- Marcel Proust




Indo na esteira da atual “fama” do distúrbio depressivo, já chamado de “a doença do século” e tida por especialistas como o mal que mais atingirá as pessoas nestes tempos, muitos estudos estão em andamento.

Dos últimos que tive notícia, um diz que sentir-se pra baixo causa dor, outro diz que a TV ligada à noite pode causar depressão...

Não li os estudos originais completos, mas os artigos sobre eles me deram a sensação de que os estudiosos ainda se debatem sobre, utilizando um exemplo clássico, quem nasce primeiro, o ovo ou a galinha.

Dizer que isso ou aquilo, isoladamente, pode causar depressão é um reducionismo pra lá de exagerado. O que é real, de fato, é que a depressão, parafraseando a brincadeira, é coisa da sua cabeça.

OK, é verdade que o mundo é uma merda, as pessoas que nos cercam em geral são idiotas e, de fato, não há luz no fim do túnel - no final, não importa o que faças, vais virar almoço de vermes no cemitério.

Mas isso, voltando à frase, é coisa da sua (e da minha também) cabeça. O mundo e a vida NUNCA foram lindos, idéia que tanto se esforçam a nos vender. Há momentos bons (poucos, admito) e momentos ruins (muitos, sem dúvida). Só isso.

Lembre-se de que fomos expulsos do Paraíso, ou seja, estar aqui é um castigo mesmo...

O que precisamos é, como diz a frase atribuída a Proust, olhar com outros olhos. Mas não, por favor, não vá arrancar os seus.

Talvez sim, sintamos mais dor que as pessoas “normais” pois deprimidos estão 1.000% voltados a si mesmos. A conseqüência natural é perceber de maneira amplificada tudo o que nos acomete, principalmente as coisas negativas, desagradáveis, como emoções, lembranças, críticas, e-mails com ppts com lições de vida e... dores.

Se alguém aqui se lembrar de um momento em que esteve alegre, eufórico (ou num episódio maníaco) lembrará, possivelmente, que estava “distraído de si” e mesmo que estivesse com um machucado, mal o percebia, não é mesmo?

Pronto, matei com um parágrafo o estudo dos pesquisadores, que com certeza receberam uma grana legal para descobrir o óbvio.

Será que é nisso que eles estão trabalhando: uma fórmula para nos fazer “ver de outro jeito”?

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

DESTINO, numa xícara de café


“De fato te mudas de cidade e de destino sem passar a ser outro, mas não muda a ti mesmo sem mudar-se de si próprio para outro”

Alessandro Ben



Dia desses o Jorge, aquele mesmo do post “Pobre Jorge”, estava em sua rotina diária de soltar pensamentos ao vento e algo o lembrou de um antigo colega, o Otávio.

Eles trabalharam e moraram juntos uma época. Garotos iniciando a vida adulta, certa vez foram consultar uma vidente. Era uma garota nova, da idade deles, que via o futuro numa xícara de café. Ou chá, não se lembrava direito.

Jorge sempre foi descrente nessas coisas, mas foi pela curtição. Queriam saber se iriam se dar bem na vida, se iam ficar ricos, se os namoros com as respectivas iam dar certo ou se teriam várias outras namoradas... A vidente ia respondendo uma a uma as perguntas dos garotos ansiosos mas, à época, as respostas pareciam carecer de detalhes.

Olhando agora, mais de vinte anos depois, as previsões não foram tão nebulosas assim. Pelo contrário, tiveram um nível de detalhes que hoje caem como uma tijolada na testa. A garota “acertou” tudo: como seria a vida profissional do Otávio, disse que ele não se casaria com a namorada da época e conheceria sua futura esposa longe, muito longe dali, que havia muitas viagens em seu futuro, disse ao Jorge que ele conheceria sua esposa naquela cidade, mas ela estaria ali apenas de passagem e ele tinha de ser rápido e coisas assim. Tudo confirmado, tintim por tintim.

Ela só titubeou, e isso Jorge se lembra bem, quando ele lhe perguntou sobre como seria sua vida profissional. A garota demorou a responder, parecia olhar fundo na xícara e então finalmente murmurou que não sabia responder essa.

Até isso ela acertou. “Hoje eu não sou nada”, pensava Jorge, “mas como ela poderia me dizer isso na época?”

Talvez nem a garota acreditasse nela mesma ao ver que o destino de Jorge era não ser nada. Talvez tenha sido a primeira vez que ela previra algo assim e se enrolou: “como pode alguém não ser nada?”, ela deve ter pensado.

Se esse era seu destino, se isso – não ser nada – já estava previsto, de que adiantaria então lutar contra? Haveria um meio de mudar esse destino? Quem sabe, talvez, indo de novo numa consulta com essa garota e perguntar a ela “e agora, que eu faço?”. Será que ela ainda estaria viva? Como localizá-la tanto tempo depois?

Descrente, cético, tinha de dar o braço a torcer nessa: estava tão cansado de tentar pelos meios “normais” dar um rumo à sua vida que começava a considerar seriamente ir se consultar com a vidente outra vez.

Seu intelecto se revirava, se contorcia diante “dessa ignorância”, mas como se fossem duas pessoas conversando, ele lembrava a si mesmo que seu intelecto não fora suficiente nas coisas mais básicas de vida, como ter um emprego ou profissão, ganhar seu próprio sustento.

Onde estaria a tal garota?...

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

ESTIVE FORA UNS DIAS...

...numa onda diferente, como na música, mas não provei tantas frutas, pelo contrário, comi muito croisant, bagels e muffins.

Foi um rápido escape a quase 8.000 km daqui mas, mesmo assim, a realidade dá um jeito de me alcançar. E voltar para ela não tem graça nenhuma. Se voltar das férias já é normalmente ruim, retornar ao "nada" é ainda pior.

Às vezes penso que não estou mais deprimido, ou ao menos não como antes, mas ainda há muita coisa mal resolvida. Algumas do passado, outras do presente, minha vida, meu futuro, o que fazer daqui pra frente é uma incógnita e, para usar um clichê bastante gasto, não vejo luz no fim do túnel. Se ao menos visse o túnel saberia onde estou e para onde vou, mas nem isso.

A aceitação de que não sou especial, no sentido de não ter algum talento a ser mostrado ao mundo que me diferencie e se torne um meio de vida, ainda é áspera. Talvez isso soe pedante, talvez egocêntrico, mas eu sinceramente achava que sim, que poderia mostrar ou fazer algo através da escrita ou da ilustração - ou os dois combinados - e viver desse suposto "talento", mas aparentemente ninguém parece interessado em me pagar por essas atividades.

Agora, já dobrando o cabo da boa esperança, preciso deixar de resistir, inutilmente, ao que parece inevitável: tenho de arranjar um meio de vida qualquer, medíocre, para pagar as contas.

É o que todo mundo faz? Sim, mas é tudo o que um deprimido não gosta de ouvir ("todo mundo isso, todo mundo aquilo...") e me deixa ainda mais para baixo.

Nem sei se conseguirei - quem irá me contratar depois de tanto tempo fora do "mercado"? - nem tenho condições de montar um negócio, e o pavor da sensação de "não pertencimento" já me assombra. Passei boa parte de minha vida adulta profissional com um sentimento, como canta Thom Yorke do Radiohead, de "...What the hell am I doing here? ...I don't belong here...".

Mas, então, qual o meu lugar nesse mundo? Será que tenho algum?

terça-feira, 28 de setembro de 2010

DEPRESSÃO E DEPRIMIDO...

...é o novo blog sobre esse assunto tão conhecido e ao mesmo tempo tão complexo e subestimado.
Como declara seu autor, Edgar Guediguian, inspirado aqui no Crônicas.

Ter inspirado alguém a escrever já é muito mais do que eu jamais imaginei para o Crônicas. Escrever, divulgar e discutir sobre depressão pode ter um efeito bastante benéfico sobre quem participa dessas atividades.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

POBRE JORGE

 
“A vida de todo mundo é como uma longa calçada. Algumas são bem pavimentadas. Outras, como a minha, tem fendas, cascas de banana e bitucas de cigarro”.

Max Horowitz



Jorge passara dos 40 e estava (ou era, já nem sabia mais depois de tanto tempo) deprimido.

Na verdade, como aquele cão que só entra num bosque até a metade, porque depois dela já está saindo, caminhava para os 50 e estava desempregado. Por sorte, sua mulher ganhava o suficiente para manter a casa, mas ele já duvidava de quanto tempo mais conseguiria se manter em casa.

Como dizia um colega, houve dias em que teve de se segurar no batente da porta, pois sua mulher cobrava furiosamente alguma atitude. As mulheres se habituaram rapidinho à igualdade de direitos, pensava ele, mas não à igualdade de deveres. Fosse ele, o homem, mantenedor da casa não haveria encrencas, mas são poucas as mulheres que admitem um marido “do lar”. A dele não era uma delas.

Mas Jorge...

Jorge era todo reticências. Tudo, todos os pensamentos, tomadas de decisão, argumentos, iniciativas... Tudo para ele sempre vinha acompanhado de muitas, mas muitas reticências... E assim era difícil sair de seu lodaçal de pensamentos.

Passava tardes inteiras no computador, isolado em um cômodo escuro da casa. Vez ou outra, para variar um pouco, fazia palavras-cruzadas. Certa vez estava completando uma quando leu “aqueles de bem com a vida” e, estranhamente, a primeira coisa que lhe veio à mente cabia no espaço: “retardados”. Essa palavra não cruzava direito com as outras, mas como cabia ali escreveu mesmo assim e abandonou o hobby naquele dia.

Resolveu ir ao shopping ali perto de sua casa ficar vendo vitrines. Coisa meio boiola, seu superego lhe dizia, mas para quem estava há dias enfurnado criando mofo em casa talvez fosse bom ver como andava o mundo lá fora. A tarde estava maravilhosamente cinzenta, quase fria e assim ele não suaria ao fazer o trajeto a pé.

Vitrines, vitrines, vitrines... Desempregado e duro, sem coragem de ficar pedindo dinheiro à esposa, sentia-se como um cachorro na calçada olhando frangos rolando naqueles fornos: podia babar por algo, mas não podia tê-lo.

De fato, ele nem desejava nada, só queria dispersar um pouco. Começou a rir sozinho quando viu calças jeans todas rasgadas, trituradas, vendidas a preços exorbitantes. Lembrou do Dr.House que em certo episódio disse que “...algumas pessoas gastam fortunas para parecerem mendigos...”.

Essas pessoas deviam economizar, pensou, e talvez comprar uma calça jeans “normal”, vesti-la e atravessar a 23 de Maio de olhos vendados na hora do rush. Mancharia de sangue, um pouco, mas os rasgos e ralados ficariam bem parecidos.

O cartaz no cinema anunciava o filme 2012. Nem valeria a pena assistir e sonhar com esse alívio. Os especialistas já o haviam feito desistir de esperar o fim tão próximo e o mundo, que merda, ainda ia durar muito. Acabaram com sua graça ao desmistificarem o Calendário Maia e as demais supostas previsões desastrosas.

Ele não entendia o medo que as pessoas tinham do Armagedom. O mundo, acabando, todo o sofrimento de todas as pessoas terminaria, oras! E, num país eminentemente cristão, não era a maioria delas que acreditava em vida após a morte, em “ir para junto do Senhor”? Pior ele que não acreditava em coisa alguma. Jorge havia retirado o verbete “acreditar” de seu cérebro. Tornara-se racional, exato, lógico.

Isso o fez lembrar de Max, que trocava cartas com Mary (veja o trailer). Ele se identificava com o personagem (outro trecho do filme). No filme... Bem, não vou contar o fim, mas ele imaginava que terminaria como Max.

Aliás, Jorge havia se tornado tudo o que no passado, em seus piores pesadelos, temera: solitário, fracassado, pobre, sem perspectivas, gordo e com dores pelo corpo. Certa vez lhe disseram que devia tomar cuidado com o que pensava, pois o pensamento negativo atrairia coisas ruins. Temer algo poderia fazer com que se tornasse real, lhe disseram, mas ele pensava diferente. Se temia era porque havia a consciência profunda de que aquilo poderia vir a se tornar realidade. Era como se a vida fosse um caminhar sobre uma lâmina: tudo pode parecer estar indo muito bem, mas basta um pequeno deslize e...

E assim, atolado em pensamentos dispersos e desconexos, Jorge passava seus dias reticentes...

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

TER DEPRESSÃO É BOM, RUIM É ESTAR DEPRIMIDO

Brincadeiras à parte, novamente se levanta a questão bastante polêmica do tal "lado bom da depressão": a revista Mente e Cérebro deste mês traz artigos nos quais especialistas afirmam que a depressão "...pode ser uma adaptação mental saudável que nos oferece melhores condições para resolver problemas complexos" em "O Lado Luminoso da Escuridão".

Em outro artigo, "É Mesmo Ruim Sentir-se Tão Triste?", explicam o TDM como um "...mecanismo de autoproteção contra situações desgastantes; o rebaixamento do humor aumenta a capacidade de concentração e nos faz rever atitudes".

Há também uma crítica (positiva, de modo geral) ao livro "A Tristeza Perdida" dos psiquiatras Allan Horwitz e Jerome Wakefield, no artigo "Com quanta tristeza se faz uma depressão?", segundo o qual "...os autores querem demonstrar que a tristeza intensa é uma capacidade natural humana e não uma fraqueza de caráter e que a tristeza é produto de processos mentais relevantes funcionando conforme foram biologicamente projetados para reagir à perda. São problematizadas as vantagens e desvantagens de haver definições demasiado amplas de transtorno depressivo, bem como tratamentos injustificados, medicalização desnecessária e estigmatização".

A depressão é comparada a uma febre: ela não é o problema, mas sim um sintoma e, como a febre, necessária em determinadas situações para o restabelecimento e reequilíbrio do organismo, ou seja, o nosso.

Ainda estou lendo, mas uma coisa me chamou a atenção: nestes e em outros artigos os especialisatas parecem ser unânimes em propor aos deprimidos que não fujam do problema, não procurem distrações ou sigam conselhos até bem intencionados como "manter a cabeça ocupada ajuda a melhorar" ou "vai trabalhar que passa". Isso apenas prolonga o sofrimento ou o transforma numa bomba relógio, que mais cedo ou mais tarde...

Ao contrário, dizem que devemos sentir o problema, vivenciar essas emoções, colocar para fora, escrevam sobre o que se está passando. Instintivamente, é mais ou menos isso que tenho feito aqui.

Experimente você também. É realmente aliviante.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

NEGÃO

Cães se conhecem uns aos outros e não sabem seus nomes. Acho bom mas, para contar essa outra estória, vamos dizer que ele se chamava Negão.

Quando eu tinha restrições de horários impostas pelo trabalho levava minhas cadelas para passear na praça próxima de casa à noite, após o expediente.

A primeira vez que vi Negão fiquei receoso: grande, magro, sentado num canto escuro da praça, meio descabelado e olhos amarelados, logo me fez lembrar aquelas cenas de filmes de terror em que os olhos de alguma fera brilham no escuro da noite.

Ele se aproximou hesitante, não veio diretamente a nós, circundando o que podia ser um invasor hostil. Fiquei preocupado, pois ele poderia realmente se sentir ameaçado (por uma ferocíssima ShihTzu de lacinhos rosa e uma Schnauzer com a personalidade do Garfield).

Estávamos estudando a situação, olhos fixos um no outro apesar de já ter lido que contato visual pode ser interpretado como agressão. Se é verdade, ele que ficasse com medo de mim.

Curiosas e solícitas demais, sem nenhuma noção de perigo, as duas correram para conhecê-lo. Percebi que ele ficou um tanto incomodado, como que com medo delas. Caminhou em minha direção, fiquei firme e, de repente, ele encostou a cabeça em minha perna (quase em minha cintura) pedindo um afago...

Ficamos amigos.

Continuei encontrando Negão por diversas vezes, inclusive depois que ele se associou a um morador de rua. Tomava conta dos apetrechos do homem enquanto ele ia comprar pinga e salame no bar da esquina.

Brincalhão, corria pela praça solto, livre, sem horários nem obrigações. Ambos dormiam no coreto, mas Negão tomava seu banho de sol diário deitado entre os canteiros floridos. Pena nunca ter me ocorrido bater uma foto com o celular. Acho que ainda não me acostumei a tirar fotos com o telefone.

Quando chegava na praça ele corria em nossa direção e sempre vinha me cumprimentar. Algumas vezes levei ração, mas ele ignorava. Estava mais acostumado a comida de verdade, restos que o sem-teto lhe dava.

Uma vez o vi sozinho, do outro lado da Avenida Matarazzo, muito movimentada. Ele parecia estar querendo atravessá-la, mas estava difícil. Estacionei o carro, fui resgatá-lo, acompanhando-o a pé na travessia da avenida e deixei-o na praça, fechando o portão.

Certo dia, novamente na tal praça para o passeio diário, porém agora sem limitações de horário, encontro o morador de rua arrastando um pesado cobertor. Era Negão ali, sem um pedaço de seu flanco direito, sem vida.

Deve ter sido atropelado, mas o tal senhor insistiu em dizer que foi maldade de alguém, que aquilo era coisa feita com facão, que já haviam dito que iam matá-lo pois ele havia encrespado com alguns cães maiores, com donos, que também freqüentam a praça.

Nunca saberemos.

Adeus, Negão.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

MUNDO CINZA

Cientistas alemães "descobriram" que pessoas acometidas pela depressão enxergam o mundo menos colorido que as pessoas "normais"...

Alguém lembra daquela música "Things that make me go hmmmm..." ?

Eu entendo a metáfora em se dizer que o mundo fica menos colorido quando se está deprimido, mas daí a dizer que a retina começa a sofrer alterações e a pessoa pára de enxergar cores tem uma distância enorme. Até acredito que o cérebro do deprimido tenha problemas de decodificação do mundo externo e, por isso, "...as cores já não têm a cor que tinham, que a música não soa como soava antes e que a sensação é realmente de que o mundo está mais apagado...", mas isso é uma tentativa de traduzir em palavras uma sensação, não algo físico.

Bem, a pesquisa foi feita na Alemanha, país quase o ano todo cinzento, como relata uma colega que se mudou pra lá.

Queria ver o resultado dessa pesquisa aqui nos trópicos, com sol escaldante de outubro a abril.

Eu passei por fases bem terríveis e não me lembro do mundo ter perdido as cores, a não ser metaforicamente.

Você, que teve ou tem depressão, enxerga mesmo em tons de cinza?

Pra quem quiser ler, aí está: http://veja.abril.com.br/blog/diz-estudo/