quarta-feira, 3 de novembro de 2010

DESTINO, numa xícara de café


“De fato te mudas de cidade e de destino sem passar a ser outro, mas não muda a ti mesmo sem mudar-se de si próprio para outro”

Alessandro Ben



Dia desses o Jorge, aquele mesmo do post “Pobre Jorge”, estava em sua rotina diária de soltar pensamentos ao vento e algo o lembrou de um antigo colega, o Otávio.

Eles trabalharam e moraram juntos uma época. Garotos iniciando a vida adulta, certa vez foram consultar uma vidente. Era uma garota nova, da idade deles, que via o futuro numa xícara de café. Ou chá, não se lembrava direito.

Jorge sempre foi descrente nessas coisas, mas foi pela curtição. Queriam saber se iriam se dar bem na vida, se iam ficar ricos, se os namoros com as respectivas iam dar certo ou se teriam várias outras namoradas... A vidente ia respondendo uma a uma as perguntas dos garotos ansiosos mas, à época, as respostas pareciam carecer de detalhes.

Olhando agora, mais de vinte anos depois, as previsões não foram tão nebulosas assim. Pelo contrário, tiveram um nível de detalhes que hoje caem como uma tijolada na testa. A garota “acertou” tudo: como seria a vida profissional do Otávio, disse que ele não se casaria com a namorada da época e conheceria sua futura esposa longe, muito longe dali, que havia muitas viagens em seu futuro, disse ao Jorge que ele conheceria sua esposa naquela cidade, mas ela estaria ali apenas de passagem e ele tinha de ser rápido e coisas assim. Tudo confirmado, tintim por tintim.

Ela só titubeou, e isso Jorge se lembra bem, quando ele lhe perguntou sobre como seria sua vida profissional. A garota demorou a responder, parecia olhar fundo na xícara e então finalmente murmurou que não sabia responder essa.

Até isso ela acertou. “Hoje eu não sou nada”, pensava Jorge, “mas como ela poderia me dizer isso na época?”

Talvez nem a garota acreditasse nela mesma ao ver que o destino de Jorge era não ser nada. Talvez tenha sido a primeira vez que ela previra algo assim e se enrolou: “como pode alguém não ser nada?”, ela deve ter pensado.

Se esse era seu destino, se isso – não ser nada – já estava previsto, de que adiantaria então lutar contra? Haveria um meio de mudar esse destino? Quem sabe, talvez, indo de novo numa consulta com essa garota e perguntar a ela “e agora, que eu faço?”. Será que ela ainda estaria viva? Como localizá-la tanto tempo depois?

Descrente, cético, tinha de dar o braço a torcer nessa: estava tão cansado de tentar pelos meios “normais” dar um rumo à sua vida que começava a considerar seriamente ir se consultar com a vidente outra vez.

Seu intelecto se revirava, se contorcia diante “dessa ignorância”, mas como se fossem duas pessoas conversando, ele lembrava a si mesmo que seu intelecto não fora suficiente nas coisas mais básicas de vida, como ter um emprego ou profissão, ganhar seu próprio sustento.

Onde estaria a tal garota?...

Um comentário:

  1. /=

    Não ser nada é triste e até que tem lógica o raciocíno (pessimista, é veradde) de que a garota tenha visto exatamanete nada na xícara. Acho que entendo bem o que é 'ser um Jorge da vida', quer dizer, um Zé ninguém que não conseguiu nem as coisas mais básicas (ter uma profissão e tals). Mas acho que o Jorge deveria pensar que essa anormalidade talvez tenha cura... Eu descobri isso. Se quiser me add: fabiklara@hotmail.com, eu te conto. :)

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