segunda-feira, 2 de agosto de 2010

CULPA

Limb by limb, tooth by tooth
Tearing up inside of me
Every day, every hour
I wish that I was bullet proof

Bullet Proof - Radiohead


Todo mundo que já leu algum artigo sério sobre depressão sabe que a “culpa”, esse sentimento dilacerante, é uma constante nos acometidos pelo transtorno.

Muitos já leram também – e eu citei aqui – que a auto-ajuda não auxilia quem realmente precisa, e eu coloco na categoria de auto-ajuda aquelas mensagens e vídeos sobre alguém que sofreu muito, tem grave deficiência ou doença mas deu a volta por cima.

Muita gente parece gostar de receber esses vídeos ou apresentações em Powerpoint. Aparentemente, o efeito esperado é algo como “...oh, veja como esse aí sofreu. Eu até que estou bem comparado com ele...” e o indivíduo sai - iludido - achando que a vida dele nem é tão ruim.

Eu detesto, e nem é porque são bregas ou chatos, mas porque em mim resultam numa piora de meu estado. Ou resultariam, se eu não conhecesse esse mecanismo e não lutasse contra ele.

Dia desses recebi um vídeo sobre um cara sem braços e pernas. Não vi mais que dois segundos e por isso não sei o que o cara apronta, mas com a sugestiva frase “Pare de reclamar da vida” já fiquei puto.

Minha leitura – e a de muitos depressivos - é: “...ah, o cara não tem braços nem pernas mas está aí, desfrutando da vida, fazendo isso e aquilo enquanto eu estou aqui super saudável mas semi-morto ... Sou um merda mesmo...”.

Com braços e pernas normais, o efeito em mim é o contrário do esperado e, apesar de conhecer esse processo mental, não é fácil controlar o sentimento de culpa que sobe pela garganta como um vômito. Culpa por não reagir a contento, culpa por não ser o que esperavam de mim, culpa por não ser o que EU esperava de mim... culpa... culpa...

E então a garota do caixa pergunta se não quero colaborar com o planeta e colocar as compras em caixas ao invés de sacolinhas plásticas...

O mundo que se exploda!

3 comentários:

  1. Achei este texto interessante, mas não achei de bom tom a referência feita à pessoa privada de seus membros por "tronco ambulante" (conheço essa história). Fico imaginando alguém referir-se a mim, diante da luta que travo contra a depressão e outros transtornos emocionais (acredite, ainda tenho em meu 'pack' TOC, transtorno da ansiedade e determinadas fobias) como um "retardado mental" que insiste em viver e ser produtivo. Se cobramos - e com razão - uma posição que respeite nossas limitações por parte daqueles que estão ao nosso redor, da mesma forma, precisamos ser cuidadosos ao tratar da desgraça alheia.

    Por favor, peço que compreenda que minha crítica se faz à maneira como o personagem foi denominado. Entendi o objetivo de citá-lo bem como sua linha de raciocíonio em todo o texto e compartilho dos seus sentimentos em relação ao tema culpa, até porque sofro com isso também.

    ResponderExcluir
  2. Olá Ian.
    Obrigado pela sua cuidadosa crítica. Você tem razão, não foi de bom tom. Meu lado Dr.House às vezes aflora descontroladamente.
    A expressão utilizada para nomear o indivíduo surgiu sem nenhuma reflexão, escrevi como me veio à cabeça.

    ResponderExcluir
  3. como já li uma vez: "Somos felizes quando não esperamos muito da vida"

    ResponderExcluir